Uma tendência estrutural pouco visível, mas com impactos profundos na viticultura mundial
A redução da área global de vinhedos 2024 é um sinal claro de transformação estrutural na vitivinicultura. Menos vinhas, menos uvas, menos vinho.
Essa é a lógica inevitável que surge ao analisarmos um dos dados mais discretos, mas mais reveladores, do relatório da OIV 2025. A área total de vinhedos no mundo continua a diminuir.
Em 2024, foram contabilizados 7,096 milhões de hectares (mha), uma queda de 0,6% em relação a 2023, marcando o quarto ano consecutivo de retração.
Aparentemente modesta, essa redução esconde um movimento de reestruturação global silenciosa. As razões são diversas: mudanças econômicas, pressões regulatórias, abandono rural, mudanças climáticas e até transições geracionais em zonas vitícolas tradicionais.
Adaptado de State of the World Vine and Wine Sector in 2024 – OIV 2025.
Onde os vinhedos estão desaparecendo?
A Europa ainda concentra quase metade da superfície global de vinha, mas também é onde ocorre a maior parte das perdas:
- Espanha, maior vinhedo do mundo, perdeu 14,5 mil ha em um ano (-1,5%).
- Portugal teve uma das maiores quedas relativas: -5,1%, com apenas 173 mil ha remanescentes.
- França também recuou (-0,7%), apesar da estabilidade histórica.
A exceção europeia é a Itália, que cresceu ligeiramente para 728 mil ha, mantendo sua posição como terceiro maior vinhedo do mundo.
Fora da Europa, observa-se um padrão semelhante:
- China, com 753 mil ha, estabilizou-se após anos de expansão, mas com leve queda em 2024.
- Turquia, quinta maior do mundo, perdeu 20% da área em uma década.
- Estados Unidos, em queda contínua desde 2013.
- Argentina e Chile também encolheram consideravelmente.
Quem está crescendo?
Alguns países apresentam sinais de vitalidade:
- Índia cresce de forma constante desde 2019, atingindo 185 mil ha (+1,8% em 2024).
- Brasil segue ampliando pela quarta safra consecutiva, com 83 mil ha (+1,6%).
- Rússia expandiu 2,2%, alcançando 108 mil ha.
- Grécia e Romênia também cresceram ligeiramente.
Esses casos, embora pontuais, apontam para novas dinâmicas e potenciais polos de renovação vitícola.
Adaptado de State of the World Vine and Wine Sector in 2024 – OIV 2025.
Por que isso importa?
A redução da área vitícola global não é apenas uma questão de produção: ela afeta diretamente a diversidade de castas, o equilíbrio territorial, o tecido econômico de regiões vinícolas e a segurança cultural do setor.
Menos vinhedos significam, potencialmente, menos terroirs, menos identidades locais, menos histórias embutidas no vinho.
Ademais, uma vinicultura concentrada em menos regiões tende a ser mais vulnerável a choques climáticos e logísticos, como vimos em 2023 e 2024.
A viticultura do futuro: menos, mas melhor?
Esse recuo pode abrir espaço para uma transformação qualitativa. Vinhedos mais sustentáveis, menor dependência de volume, maior valor agregado, e uma reconexão com o patrimônio vitícola local. Mas isso exige planejamento, inovação e vontade política.
Essa trajetória confirma a redução da área global de vinhedos 2024 como um dos fenômenos mais relevantes e estratégicos para o futuro da produção de vinho.
Próximo artigo da série: Vinho em Queda: O Mundo Está Bebendo Menos? No próximo capítulo da série, vamos explorar a queda do consumo global de vinho: um fenômeno que combina mudanças culturais, demográficas e econômicas em todo o mundo.
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